14.4.07

Olhão 1.

O dia 16 de Junho de 1808, assume um particular significado para Olhão, uma vez que foi a primeira localidade em Portugal a efectivamente assumir a sua revolta contra o governo francês do general Junot. Outras revoltas ocorreram no Norte, nomeadamente após a retirada da tropa espanhola, mas o receio de represálias levou a um discreto desaparecimento dos simbolos nacionais.
No Algarve, em que a presença francesa era dimínuta e, onde também os espanhóis retiram de volta ao seu país, a revolta poderia triunfar com alguma tranquilidade, desde que de Lisboa não fossem enviados mais efectivos.
Inicialmente como em todo o país, as autoridades recebem bem os franceses, mas os sucessivos impostos lançados por esta administração estrangulam a já de sí muito depauperada economia. Surgem portagens para quem queria sair da região pela Serra do Caldeirão, uma taxa por cada embarcação, bem como a obrigação de as mesmas possuírem um número que as identificasse, uma percentagem do pescado capturado, entre outros.
Também aqui foi confiscado algum do ouro e da prata das igrejas, mas o que terá causado maior celeuma foi a pena de morte aplicada aos contrabandistas. Considerando que em todos os portos existia um grande número dos mesmos, esta não foi uma iniciativa bem aceite e sobretudo, porque os próprios franceses dedicavam-se à mesma actividade.
Um facto curioso é o de os olhanenses terem de se deslocar a Faro para efectuar os pagamentos dos impostos, podendo constatar que os farenses recebiam um tratamento bem mais tolerante, pois assim garantiam os franceses a sua boa vontade e também que muitos afrancesados estavam a colaborar com os mesmos. Assim começaram a chamar "carecas" aos seus vizinhos.
Dos vigaristas também se passou a dizer que "tinham mais artes que Napoleão". De qualquer modo e com um crescente sentimento de ódio, Olhão acolhe uma reduzida guarnição, que depois da retirada espanhola, é manifestamente insuficiente para continuar a calar a revolta.
A rivalidade entre Olhão e Faro já era nesta altura secular, agravara-se pelo já descrito, agora bastava um lançar fogo ao rastilho que foi crescendo, quer com a notícia da revolta em Espanha, quer com outras em Portugal. Um ultimo edital de Junot, afixado a 11 de Junho, apela à calma e convida os portugueses a voluntariarem-se para o exército francês.
Mas o que ditou finalmente a revolta foi o facto de no dia 12 o altar do Compromisso Marítimo, situado na igreja matriz, possuir para além dos símbolos religiosos, as armas da família real. Como tinha sido ordenado, estas estavam cobertas por um pano, no entanto o escrivão João da Rosa resolve pô-las a descoberto para os festejos de Santo António. Logo um grande alarido se levantou entre a população e à noite já uma bandeira tinha sido hasteada.
Nada mais ocorre até ao dito dia 16, quando o coronel José Lopes de Sousa ao ver que alguns pescadores tentavam ler o edital afixado na porta da igreja, rasga-o e com o seu discurso patriótico consegue a adesão imediata à causa nacional. A guarnição é aprisionada, os poucos soldados portugueses que estavam na fortaleza da Armona também se juntam aos revoltosos fornecendo artilharia, o mesmo não se passa com os da fortaleza de S. Lourenço.
João Pincho, parte de Olhão para Ayamonte com o objectivo de entrar em contacto com uma esquadra inglesa, pelo caminho encontra o capitão Sebastião Martins Mestre, que a 13 de Junho com a ajuda de alguns populares, ocupara a fortaleza de S. João, na Barra de Tavira. Os ingleses não fornecem qualquer tipo de ajuda, mas a junta de Ayamonte entrega-lhes algo como 130 espingardas.
De Faro vêm então alguns padres, enviados pelo general Maurin, comandante da zona e que traziam uma mensagem de paz e perdão para todos os que se tinham revoltado. Os olhanenses recusam e são ameaçados com terríveis represálias. Para isso são convocadas as guarnições de Vila Real de Santo António e de Tavira, vindo estes últimos de caíque pela ria formosa.
O Coronel Lopes de Sousa soube destas movimentações por correios que foram interceptados e ao constatar que os franceses não iriam passar longe de Olhão, foi com algumas lanchas ao seu encontro e no local da barra nova, apanhou-os desprevenidos, talvez por terem sido confundidos como simples pescadores, o que é certo é que a abordagem decorreu quase sem troca de tiros e no final 80 soldados de França estavam em poder dos revoltosos.